Nascida em Amparo na família Alves Pimentel, casou-se com Henrique da Cunha Bueno, que nascera trinta anos antes dela, e juntos atravessaram as marchas e contramarchas da economia do café, até que ela, já viúva, o sucedeu integralmente na lide da fortuna e das relações pessoais e políticas que caracterizavam a elite fazendeira e empresarial paulista do século XX. Este livro, que apresenta com maestria sua notável biografia, é também a narrativa de uma saga feminina marcada por decisões, por ações e por libertações que matizam a convicção de que o patriarcado foi uma muralha de poder absolutamente intransponível às mulheres.
 
Ana Luiza Martins nos oferece os passos sucessivos de uma moça paulista que quis ser aluna da Escola de Farmácia, que escolheu seu marido, que reconstruiu suas fazendas, que foi uma das primeiras prefeitas do Brasil. Sebastiana da Cunha Bueno dedicou-se simultaneamente ao conhecimento das inovações tecnológicas da lavoura, a numerosas ações de amparo social e ao empreendedorismo imobiliário na capital, deslocando-se da esfera privada, em tese destinada às mulheres, à esfera pública com desenvoltura. Sua trajetória soma-se assim a de outras lideranças femininas das elites paulistas, como Veridiana da Silva Prado, Maria Angélica Aguiar de Barros, Olivia Guedes Penteado, Carlota Pereira de Queiroz e Yolanda Penteado, assim como as de centenas de milhares de mulheres de todos os segmentos sociais que chefiavam suas casas, que lideravam suas famílias e que construíram os caminhos diversos de liberdade e de oposição às barreiras impostas pela tradição.
 
Apoiada em uma riquíssima documentação, Ana Luísa Martins renova ainda a história da cafeicultura, ao nos aproximar de um cultivo que sobreviveu aos desabamentos internacionais de preços, às monumentais queimas de sacas, ao arrefecimento das correntes imigratórias e ao empalidecer da hegemonia política paulista. (...).

Paulo César Garcez Marins Historiador e docente do Museu Paulista da USP.